segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Episodio XXIII - Mão ao Pé

É como aqueles momentos em camas de hospitais.

Trata-se de um alguém que está deitado numa cama. E é velho. E está só. E não faz nada senão viver. E existe.

Mas é alguém que vai tendo as enfermeiras ao pé.

Umas que entram no seu quarto, a tagarelar sem um fim próximo e outras que sem mais nada agarram na sua mão a fazer festinhas como se fosse a tarefa das 16 horas da tarde.

Todas borradas de medo de fazer uma pergunta que seja sobre esse alguém porque sabem que é (mais um) velho deitado numa cama de hospital que não faz nada senão estar acordado e ter a consciência que apenas está a existir, praguejando a toda a hora na sua cabeça que o que mais lhe apetece é fugir dali p’ra fora.

Todas a arrastar a voz como que se fosse mais animador quando na verdade faz perder a paciência porque demora-se 3 minutos a ouvir algo de 30 segundos.

Todas com conversas do dia solarengo ou dos mexericos da vida nos corredores hospitalares sobre a médica que deixou cair o estetoscópio no chão e rachou a saia enquanto apanhava. Todas com discursos do mais puro nada a cumprir a tarefa das quatro da tarde.

Então esse alguém tem de fazer alguma coisa.

Então

espera por alguém.

Porque o que se quer é ter alguém.

Não importa o tempo que faz, o discurso que tem, a beleza que traz.

O que se quer é alguém que se chegue à nossa beira e que se faça sentir. Que não precise de dizer nada e que estenda a mão junto da nossa sem a tocar.

Porque sem uma palavra dizer, pergunta a esse velho que existe se quer alguma coisa.

Porque se ele quiser, ele que estenda a mão e que agarre.

Porque a companhia está lá. Está presente. É um presente.

Ele só precisa de a ir agarrando de vez em quando.

Umas vezes é um toque, outras, um simples poisar, um cruzar de dedos ou ser um forte aperto que nos toca até ao coração.

É como aqueles momentos em camas de hospitais.

Trata-se de alguém que está deitado numa cama. Mas que não é velho. Não está só. E que vive.

Faz mais que existir mas no entanto espera por alguém. Que se faça sentir. Que mostre a sua mão e o seu punho ao pé da mão e do punho dessa pessoa.

Para que seja preciso apenas agarrar quando é preciso, afastar os lençóis e ajudar a levantar da cama.

Depois disso vem um banho e tudo ficará melhor.

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